Quais são os planos do relator da reforma tributária

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O sistema tributário brasileiro não agrada a quase ninguém. Empresários reclamam que a carga é alta e o sistema, confuso. Políticos defendem redistribuição das cobranças. Há quem queira mais dinheiro para Estados e municípios, quem defenda cobrança maior sobre os mais ricos e quem queira simplesmente pagar menos tributos. É praticamente geral a insatisfação.

É desse sentimento que o deputado Luiz Carlos Hauly (PSDB-PR) quer se aproveitar para tentar votar mudanças no sistema tributário brasileiro. Desde o início de 2017, ele relata um projeto de reforma tributária que tem como foco a simplificação do processo.

Outros projetos de mudança na cobrança de tributos falharam no passado, quase sempre porque o Congresso não se entendia sobre a divisão dos recursos. Fernando Henrique Cardoso, Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff mandaram projetos para o Congresso e fracassaram.

Para que seu projeto tenha um destino diferente, Hauly tem se reunido com empresários e políticos e feito uma promessa: ninguém vai perder recursos com a mudança. O foco do projeto é a simplificação do sistema.

A avaliação do tucano é de que o sistema brasileiro de tributação se tornou um “Frankenstein” com as diversas modificações que sofreu ao longo dos anos. Segundo seus cálculos, desde a criação do sistema, na década de 1960, houve pelo menos sete reformas que o tornaram confuso.

Com tantas guias, documentos, taxas e leis, uma empresa nacional perde muito tempo e dinheiro calculando e pagando impostos. Segundo o relatório “Doing Business”, do Banco Mundial, o tempo médio gasto com a burocracia dos impostos por uma empresa no Brasil é de 1.958 horas, seis vezes mais do que a média dos países da América Latina. No mundo, o Brasil é o 184º colocado entre 190 países em um ranking de tempo gasto.

O foco da reforma é a transformação de nove tributos em apenas um: o IVA (Imposto sobre Valor Agregado). Isso, segundo o relator, facilitaria a cobrança, o repasse do dinheiro para Estados e municípios e dificultaria a sonegação.

A simplificação do sistema, na avaliação de Hauly, pode ser o primeiro passo para tornar a cobrança de tributos mais justa e mais progressiva, pesando menos sobre os mais pobres e mais sobre os mais ricos. O passo seguinte deveria ser a diminuição da cobrança de impostos sobre o consumo e o aumento sobre a renda.

A reforma tributária já foi defendida abertamente pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e tem a simpatia do governo. Mas no momento está em segundo plano, enquanto Michel Temer tenta aprovar mudanças na Previdência. O pacote da reforma do sistema tributário tem oito projetos de lei e uma PEC (Proposta de Emenda à Constituição), que depende de três quintos dos votos para ser aprovada.

Abaixo, os principais trechos da entrevista de Luiz Carlos Hauly ao Nexo.

Quais os pontos fundamentais da reforma?

LUIZ CARLOS HAULY O sistema brasileiro, nos últimos 50 anos, foi se tornando mais complexo e irracional. O cerne da reforma é a simplificação e a tecnologia. É harmonizar o sistema tributário brasileiro com o europeu e canadense. A reforma não mexe com impostos sobre propriedade e trabalho, mas simplifica a cobrança na renda e no consumo. Na renda, elimina a CSLL (Contribuição Social sobre o Lucro Líquido), fica apenas o Imposto de Renda para as empresas. No consumo, que é o pior, vamos simplificar eliminando nove tributos e criando o IVA. O IVA tem cobrança eletrônica, isso não é nenhuma invenção.

Com o governo com outra prioridade, como aprovar alguma reforma tributária no Congresso?

LUIZ CARLOS HAULY Estou trabalhando desde o início do ano, percorri 22 estados, tive 170 reuniões de trabalho. Eu estou tentando desmistificar a dificuldade de aprovação da reforma, garantindo que não haverá perdas para União, Estados e municípios ou para empresários. Ao contrário, há uma conscientização de que do jeito que está, todo mundo perde. Simplificar elimina as burocracias, a gordura da complexidade, diminui sonegação, incentivos fiscais.

Qual a sua avaliação sobre a carga tributária do Brasil?

LUIZ CARLOS HAULY O Brasil tem 33% de carga. É a 20ª maior carga do mundo na 8ª economia do mundo. Se pensar que 2 pontos dessa carga são FGTS (Fundo de Garantia por Tempo de Serviço), fica algo perto de 31%. E não entra em questão se o governo gasta bem ou mal, não sou relator do Orçamento, nem do pacto federativo, mas da Reforma Tributária, da engenharia tributária e de inclusão social. Mas acaba que a reforma vai reduzir a carga. Porque é um sistema que tem R$ 2 trilhões de estoque de contencioso [disputa judicial], R$ 3 trilhões de dívida ativa, R$ 500 bilhões de renúncia fiscal, R$ 460 bilhões de sonegação e bilhões e bilhões de burocracia. Isso é excesso de carga.

Qual sua opinião sobre tributação maior para renda, fortunas e herança, e sobre mudanças na cobrança sobre lucros e dividendos?

LUIZ CARLOS HAULY Eu faço o diagnóstico do problema: o sistema é regressivo, tributa demais o consumo e isso pesa mais sobre os que ganham menos. E tributa menos quem ganha mais. Existem formas de tributar mais os que ganham mais: na renda, na propriedade e no consumo com devolução direta, tipo Nota Fiscal Paulista. Isso teria um impacto muito mais forte que todos os programas sociais juntos. Mas eu não posso, como relator, fazer isso sozinho. Isso precisa de um acordo nacional com empresários, profissionais liberais, governo e Congresso. Eu estou disposto a gerenciar isso. A mudança de tributação da renda da pessoa física não está na reforma. O que a reforma vai fazer é acabar com a Contribuição Social sobre Lucro Líquido, aí a Receita Federal vai ter que mandar um outro projeto. Se os congressistas quiserem, podemos mexer na tabela do Imposto de Renda. Mas qualquer aumento de carga no Imposto de Renda tem de vir acompanhado de uma diminuição da carga tributária do consumo. O compromisso da reforma é não aumentar a carga tributária, mas também não comprometer arrecadação do governo.

Qual a sua opinião sobre: imposto sobre fortuna e herança, novas alíquotas de Imposto de Renda e mudança na cobrança de imposto sobre lucros e dividendos.

LUIZ CARLOS HAULY [Imposto sobre] Grandes fortunas já existe no texto constitucional, então ele não é objeto de uma reforma constitucional. Falta a regulamentação e não sou eu que tenho que propor. O objetivo da reforma é melhorar a tributação no Brasil e acho que dá para fazer através do IPTU, do IPVA, transmissão causa mortis, transmissão inter vivos e ITR. São cinco tributos que existem no mundo inteiro, o grandes fortunas tem em meia dúzia. Os Estados Unidos não têm imposto de grandes fortunas, mas tem tributação pesada no imposto de renda sobre fortuna e herança. A mudança do Imposto de Renda tem de ser feita, o Brasil não tem de fazer nem mais nem menos que os outros países do mundo. Há espaço para novas alíquotas, mas qualquer aumento de cobrança na renda tem de vir acompanhada de redução no consumo. O mesmo para a mudança na tributação de lucros e dividendos [que atualmente é feita só na empresa e isenta na pessoa física]. Nós ainda não fizemos o beabá e estamos preocupados com outras coisas. O beabá é a simplificação do sistema e ter cobrança eletrônica. Depois vamos para uma segunda etapa, que é buscar mais justiça.

Qual a avaliação sobre a distribuição da tributação entre as esferas de poder?

LUIZ CARLOS HAULY A reforma não mexe nisso. Com o IVA, analisa a arrecadação efetiva dos últimos anos, e cada município, cada Estado e a União terão um percentual desse bolo. Em cada operação de compra e venda de mercadoria, bens e serviços, o percentual do dinheiro vai direto para o cofre de cada um, acaba com a história do repasse.

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